Torcedor do Vasco, com o qual subiu da Série B para a Série A em 2022 como figura de destaque da equipe, e com um carinho tremendo pelo CSA, clube que praticamente salvou a sua carreira, Yuri Lara não sabe por quem vai torcer no confronto entre as equipes nas oitavas de final da Copa do Brasil. O jogo de ida, em Maceió, é nesta quarta-feira.
Nascido e criado na Pavuna, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, Yuri cresceu numa família rodeada de vascaínos e frequentou São Januário inúmeras vezes como torcedor. "É o clube do meu coração", afirma ele. Três temporadas atrás, ele realizou o sonho de vestir a camisa vascaína e foi peça essencial na campanha do acesso. Uma passagem curta, de apenas um ano, mas marcante e repleta de significado.
Seria natural pensar que ele vai torcer pela classificação do Vasco para as quartas de final, certo?
"Acho que vou ficar em cima do muro nessa porque são dois clubes muito importantes na minha carreira", revelou o volante de 31 anos.
- Se fosse qualquer outro clube que eu tivesse jogado, sem ser Vasco e CSA, eu daria meu palpite. Mas dessa vez eu vou ficar em cima do muro (risos). Ter que optar por Vasco ou CSA é difícil. Vou torcer aqui, vou assistir, mas sem escolher um. Quem jogar melhor e passar, está tudo bem - completou em conversa com o ge.
Yuri Lara diz isso porque o CSA não foi apenas um clube pelo qual ele passou na carreira. Em 2018, ele foi campeão alagoano e atuou em 30 partidas na campanha que garantiu o vice-campeonato na Série B do Brasileiro e colocou a equipe alagoana na elite pela primeira vez em três décadas. Mas, para além disso, o CSA foi quem abriu as portas para que ele pudesse recomeçar no futebol.
Yuri foi lançado ao futebol pelo Bahia em 2015, mas logo no início da carreira precisou ficar quase dois anos parado por uma série de problemas no joelho. Ele rompeu duas vezes o menisco e foi submetido a três cirurgias nesse período.
- Eu passava por um momento muito difícil. O Bahia não ia me utilizar e eu não tinha para onde ir, entendeu? Não tinha perspectiva. Eu voltava a treinar. Quando eu estava pronto para jogar, me lesionava. Foi uma fase muito difícil da minha vida porque eu não sabia mais o que fazer, não tinha clube para eu ir - lembrou o volante que hoje joga no Yokohama FC, do Japão.
Foi quando o CSA surgiu. Em 2018, O clube alagoano decidiu apostar numa contratação por empréstimo do jogador que havia atuado em apenas sete partidas nas duas temporadas anteriores.
"E o CSA me abriu as portas. Eu voltei para o futebol por conta do CSA. É um sentimento muito forte também, é um clube muito importante para a minha carreira", afirmou.
Por mais que seja carioca e tenha crescido acompanhando o Vasco de cima para baixo, Yuri Lara se distanciou do clube a partir do momento em que se lançou na carreira de jogador. A vida o levou por um caminho diferente: da base do Olaria, ele se mudou para Salvador para completar sua formação no Bahia e ficou ainda mais longe de São Januário. Passou por Oeste, Ferroviária e foi jogar até no Japão. A possibilidade de um dia, quem sabe, defender o clube do coração naquele momento parecia irreal.
Corta para 2021. Depois de uma temporada de destaque pelo CSA, aos 27 anos e mais experiente, Yuri recebeu a notícia de que o Vasco estava interessado na sua contratação. Naquele momento, o time carioca juntava os cacos depois do fracasso de 2021, quando terminou a Série B em décimo e não conseguiu o acesso. A diretoria buscava jogadores que, acima de tudo, quisessem vestir a camisa vascaína.
Yuri Lara foi o primeiro reforço anunciado pelo Vasco para a temporada 2022.
- Eu sabia da importância que era aquele ano. E por tudo que envolvia o clube, a pressão de ter que subir, eu sendo vascaíno, sendo morador da Pavuna, no Rio, minha família inteira vascaína, meus amigos vascaínos. Então eu tinha muito medo de as coisas não darem certo no início. Eu acreditava muito em mim, sabia que podia dar certo no fundo, mas podia não dar. E aí? Como eu ia encarar meus familiares, meus amigos, em casa se as coisas não fossem da forma que eu imaginava? Isso me dava muito medo - admitiu ele.
Mas Yuri Lara em um piscar de olhos caiu na graça dos vascaínos, que via no jogador uma extensão da torcida na arquibancada. Ele era o tipo de volante que não se importava em fazer o trabalho sujo, corria o tempo todo e não terminava as partidas sem ao menos dois ou três desarmes. Os latidos do torcedor a cada roubada de bola do volante foram a trilha sonora de um casamento que deu certo.
Yuri, o Pitbull da Colina, atuou em 40 partidas naquela temporada. Das 38 rodadas na campanha do acesso na Série B, foi titular em 34. A mais importante delas foi no dia 6 de novembro de 2022, na partida contra o Ituano, que o Vasco precisava vencer para garantir o acesso. O jogo que ficou conhecido como "Batalha de Itu".
- Aquela Batalha de Itu foi pesada, acho que cada jogador ali carregava um fardo muito grande - lembra ele da partida vencida por 1 a 0 pelo Vasco, o gol marcado por Nenê, de pênalti.
- Eu não imaginava um gol tão cedo, porque foi com dois minutos, se não me engano. Foi muito rápido. E ainda teve um jogador expulso (Lucas Dias, do Ituano). Mas a pressão estava tão grande em cima da gente que, mesmo com um a mais, a gente não conseguia desenvolver. A gente não sofria tanto perigo, mas o Thiago (Rodrigues) ainda salvou duas bolas perigosas, uma cabeçada que ele pega, estava iluminado. Se os caras fazem aquele gol ali, mesmo com um a menos, ia ficar difícil. Eu me lembro que a gente controlava o jogo, mas não tinha tanto ataque para definir o jogo, para fazer um ou dois gols no primeiro tempo, o jogo estava truncado. A pressão era tão grande, da obrigação de subir, que a gente sabia disso e refletia. Sem dúvida esse jogo, psicologicamente, foi bem difícil - resume ele.
"Um acesso, por se tratar de Vasco, não é nada, mas pelo cenário em que estava o clube, eu fico muito feliz de ter colocado o meu nome ali um pouquinho que seja na história do Vasco. Que foi o que eu me propus a fazer desde o momento em que eu pisei no Vasco", afirma ele com carinho.
Yuri tinha uma cláusula de renovação automática no contrato caso o Vasco conseguisse o acesso. O clube, por intermédio do então executivo de futebol Paulo Bracks, sinalizou que contava com ele para a temporada seguinte, mas Yuri recebeu uma proposta de três anos de contrato do Yokohama FC. Com a esposa grávida da primeira filha do casal e a boa impressão que tinha do futebol japonês por causa da passagem pelo Tochigi em 2019, ele aceitou.
Com o Vasco, está tudo resolvido. Yuri Lara chegou, jogou, alcançou o maior objetivo da temporada e foi embora sem ressentimentos no final do ano. Talvez tenha faltado só marcar um golzinho. "Ficou faltando, eu queria muito ter feito um gol. Joguei quase 50 jogos e não fiz um gol", lamenta ele três anos depois. Os vascaínos se lembram do volante com muito carinho.
Sua relação com alguns torcedores do CSA, no entanto, não é a mesma. Nas duas passagens pelo clube alagoano, Yuri ficou só um ano e deixou saudade. Na primeira, não havia muito o que pudesse ser feito já que estava emprestado pelo Bahia e precisava se reapresentar ao clube que detinha seus direitos. Mas, na segunda, parte da torcida ficou chateada por ele ter saído para jogar no Vasco.
"Eu tenho uma dívida muito grande com o CSA", acredita ele.
- Tem uma parte da torcida que eu preciso de alguma forma tentar recompensar porque eles ficaram brabos comigo quando eu saí do CSA pela segunda vez para ir para o Vasco. Eu estava livre, meu contrato era só até dezembro. Quase subimos, mas eu fui embora. Pessoal ficou chateado comigo, mas eu entendo. É coisa de torcedor, acho que tenho que dar um retorno - completou.
A cinco meses do fim do seu contrato no Yokohama FC, Yuri Lara ainda não sabe o que vai ser da vida no próximo ano. Ele espera que o clube sente com ele para tratar de renovação nos próximos meses e não se imagina voltando ao futebol brasileiro neste momento.