Para a surpresa de zero vascaínos foi anunciada hoje a venda do Vasco. Trata-se de um projeto mais antigo do que andar para a frente: desde o início do século fala-se em Companhia Vasco da Gama, um tipo de objeto fálico desejado por todos aqueles que chegaram ao clube na garupa do cabralismo, holocausto cleptomaníaco que varreu o Rio de Janeiro por décadas. O que pode parecer surpresa para muitos, para os mais atentos não é: mesmo com meio milênio de condenações na Justiça Federal, o cabralismo se mantém em alguns fossos, com nome e sobrenome. O subterrâneo da política vascaína é um deles.
Também haverá zero decepcionados se eu contar aqui que a manobra foi, é e será totalmente realizada no mais profundo obscurantismo. Para tal, tomo emprestado um trecho da nota escrita neste canal pelo Grupo Fuzarca em 14.1.2022:
Uma das atualizações feitas na peça orçamentária é quanto à captação de empréstimos. A original previa aporte de 62 milhões. A atual prevê a necessidade de 73 milhões para que as contas de 2022 sejam contempladas.
(…)
Chama-se atenção para a denominação da conta: CAPTAÇÃO/MÚTUO.
Esclarece-se que a forma de captação de empréstimo pela modalidade MÚTUO ocorre junto a pessoas físicas ou mesmo empresas que não são instituições financeiras.
(…)
Em linhas gerais, a “pré-SAF” consiste em um “investimento” primário que será compensado em cotas percentuais da SAF quando esta for criada. Ou seja, alguém investe agora e torna-se proprietário de parte da SAF no futuro.
Pois é exatamente o que a captação de empréstimo por mútuo permite. O sujeito empresta agora e, no futuro, tem seu pagamento em fatias do futebol do Vasco.
Como se pode perceber, o Orçamento do clube para 2022 prevê a captação de 73 milhões com empréstimos realizados junto a instituições não financeiras. Hoje ficamos sabendo de onde ele vem, ou ao menos qual grupo se colocará à frente daquilo sombrio que há por trás. Uma tapeação oferecida aos senhores conselheiros com requintes de laranjada.
Parece um excelente negócio para os compradores, aqueles que se põem à frente e os que estão encobertos, adquirir o Vasco: abana-se 70 milhões de “adiantamento” e o resto a ser investido, cerca de 630 milhões segundo as fontes oficiais da imprensa amiga, virá com o tempo. E que tempo é este? Aquele suficiente para que tudo o que o Vasco já capta hoje (e muito mais), entre cotas de tv, negociação de atletas, quadro social, patrocínios, etc., passe a ser captado pelos novos donos. E, então, os donos “investem” no futebol do clube valores os quais o clube já teria direito. Não é maravilhoso?
É assim. A minha padaria vale 100, eu recebo um adiantamento de 5 e parcelo o resto para o comprador. Ao me adiantar os 5, ele passa a ter direito a ocupar a padaria e vender os pães fabricados na minha agora ex-padaria. E me paga os 95 restantes com os pães que eu mesmo poderia estar produzindo. Deve ser a isso que apelidaram de negócio da China.
Quanto ao “grupo de investidores” que recebeu a promessa de doação acima descrita, confesso que sinto alguma pena dos fiéis que creem que tudo se resume a uma galera com grana que se junta e sai comprando entretenimento por aí. O tempo vai dizer, bem mais rápido do que se imagina, quais os beneficiários do jogo, alguns bem mais próximos do que se poderia pensar. Inclusive torcedores do Flamengo.
Noves fora, há que se verificar os dados disponíveis a respeito dos nossos redentores. Aqueles existentes até aqui, na vasta história de 6 anos de estrada, pressupõem fracasso desportivo retumbante, mas imagino que incrível sucesso em adquirir sucataria pré-moldada por vendilhões.
Não se pode deixar de pontuar, também, que dentre os fiéis que acreditaram nas boas intenções do fundamentalismo fálico estão aqueles que enviaram cartas com moderação e sofisticação perguntando sobre o “modelo de negócios” proposto para a SAF do Vasco e receberam como resposta um tapa na cara informando que “o Vasco é um negócio como outro qualquer”. É respeitado quem se dá o devido respeito.
O triunfo dos filhotes do cabralismo é algo que só encontra eco no Vasco atual. É certo que estas estrelas cadentes desaparecem antes do que se pode imaginar, vide a própria trajetória do vigarista que nomeia estes tempos de sombras. É bem provável que tudo isso acabe da mesma forma. O problema é a devastação que causa. O problema é a devastação que já causou.
João Carlos Nóbrega