Política

Diretoria do Vasco inicia revisão de títulos de sócios dados por Campello

Diretoria argumenta que gestão passada concedeu gratuitamente títulos que deveriam ser pagos. 

O Vasco iniciou a revisão de títulos de sócios concedidos pelo ex-presidente Alexandre Campello. No foco da averiguação, que envolve diferentes setores da administração de Jorge Salgado, estão integrantes da antiga gestão que foram agraciados como Benfeitores Remidos.

Campello, que definiu a ação como "perseguição política e dor de cotovelo", presenteou os aliados com uma categoria de associação que dispensa pagamento e dá direito a voto por julgar que prestaram serviços relevantes ao clube.

Pelo menos 10 pessoas receberam e-mail do Vasco, que cobrou a apresentação do comprovante de pagamento de R$ 24 mil, o valor do título. O entendimento da atual diretoria é que se trata de um plano pago, o que contrasta com o status de honraria adotado pelas últimas administrações em São Januário.

Não só Campello, mas também os ex-presidentes Eurico Miranda e Roberto Dinamite concederam este título como forma de homenagem a quem, de alguma forma, prestou serviços ao clube. Nomes como do ex-jogador Edmundo, da jornalista Fátima Bernardes, do cantor Roberto Carlos, do presidente do Benfica Luis Filipe Vieira e do vereador do Rio de Janeiro Alexandre Isquierdo estão na lista, que tem pouco mais de 2,3 mil integrantes.

Consultado pelo ge, o Vasco preferiu não se manifestar. Em um primeiro momento, o clube enviou a cobrança a quem recebeu o título de Campello após o dia 14 de novembro de 2020, data da eleição de Salgado.

Não há conclusão sobre os efeitos: os títulos podem ser cancelados, suspensos ou mantidos. Há uma análise jurídica em curso sobre os títulos mais antigos e, por ora, nenhuma decisão foi tomada. Debate-se, por exemplo, se essas pessoas não teriam "direito adquirido" sobre a associação. Porém, quem recebeu a cobrança tem dúvida se a investigação será ampla e entende haver elementos políticos no comportamento da atual direção.

Campello fala em perseguição e critica: "É apequenar o Vasco"

O ex-presidente Alexandre Campello, ao ser consultado pelo ge, alegou que concedeu os títulos após o período eleitoral. Segundo ele, o ato foi um reconhecimento aos serviços prestados por pessoas que se dedicaram ao clube e não eram remuneradas. Ele não soube precisar o número.

- Sempre foi assim. Estou no Vasco há 34 anos, e sempre o presidente usou dessa prerrogativa. O estatuto é omisso: não tem nada lá que diga que não pode. Há uma prática comum de anos sem nenhuma contestação anterior e, por isso, tinha autoridade de fazê-lo. Não tive nenhum cunho político, tanto que o fiz após o período eleitoral. Isso é apequenar o Vasco. A atual diretoria discutir ações da gestão anterior, de cassar títulos de pessoas que contribuíram. É se engasgar com formiga quando engole um elefante - opinou Campello.

Para o ex-presidente, há perseguição política:

- Isso tem um pouco de perseguição política, de rancor. Eles há muito tempo buscam coisas contra mim. Não o Salgado, mas alguns que foram contrariados de alguma forma. Como estão lá no poder, eles têm essa sede de revanchismo. Essa energia deveria ser melhor direcionada. Sinto pena deles. Eu dei esse título ao Pelé. Eles vão passar a vergonha de retirar o título? O que fizeram? Levaram ao Conselho para ratificar a homenagem. Por qual motivo não levaram os outros? Vão passar a vergonha de fazer o mesmo com Fátima Bernardes e Edmundo? Vão cassar o título do vereador Isquierdo que foi fundamental na concessão do terreno para o CT? Não fiz nada para mim. Foi reconhecimento.

Questionado quem seriam "eles", Campello respondeu:

- Tem pessoas que eram da minha gestão e saíram. E da Sempre Vasco (grupo que perdeu a eleição a Salgado). Sei que tem dor de cotovelo.

A data da homenagem a Isquierdo é de 3 de novembro. Em tese, anterior à data-referência para o envio dos e-mails por parte do Vasco. O ge nao conseguiu contato com o vereador.

O atual vice de Projetos Especiais, Pedro Seixas, integrou a gestão Campello como vice de Obras e Engenharia e também foi homenageado com o título de Benfeitor Remido. Ele não recebeu o e-mail pois o caso foi tratado internamente. O título foi devolvido.

Benfeitor surgiu em campanha na década de 1980

O título de Benfeitor não tem previsão no estatuto do Vasco. É uma categoria do Sócio Proprietário que remonta a 1986, quando houve o lançamento de uma campanha de arrecadação de fundos para lidar com a já existente crise financeira. Jorge Salgado, então vice de finanças, propôs o oferecimento do título na seguinte lógica: o interessado deveria pagar à vista os 25 anos de contribuição que dariam direito à remissão.

A ata de lançamento, no entender da atual direção do Vasco, deixa claro que o título é pago. Por isso, iniciou a análise interna que envolveu a recém-criada Diretoria de Integridade, a vice-presidência de Comunicação e a vice-presidência Jurídica. Os comunicados de pedido de esclarecimentos foram enviados em junho de 2021.

Além da questão financeira, o tema gera um risco eleitoral: a concessão dos títulos poderia visar a apoio na disputa presidencial - a ata da sexta reunião da Junta Deliberativa, datada de 29 de julho de 2020, que apurou a lista de aptos a voto no último pleito, indicou haver a existência de 2.337 benfeitores remidos. Por isso, no entender do Vasco, a atual forma de homenagear está equivocada. O título apropriado seria o Honorário, concedido também pelo presidente do clube, mas que precisa ter aval do Conselho Deliberativo. Essa medida foi tomada no caso de Pelé no fim de maio.

O que dizem os homenageados

A gestão Campello concedeu o título de Benfeitor Remido a quem ajudou com doações na construção do CT. Na época, o valor era de R$ 50 mil. Como houve pagamento, aqui não há contestação por parte da direção vascaína.

Carlos Leão, ex-vice de finanças, foi um dos que receberam a mensagem do Vasco. Ele se disse perplexo e constrangido:

- O presidente me concedeu o titulo após a inauguração do centro de treinamento, certamente como reconhecimento a importantes realizações. Recebi a mensagem da secretaria do clube, no último dia 21, cobrando R$ 24 mil e confesso minha perplexidade e constrangimento em ter que responder a instituição sobre um título que ela própria me concedeu. O efeito colateral pode ser muito ruim para a imagem do clube, considerando que devem cobrar e cassar títulos de Benfeitor de várias pessoas, famosas ou não, que contribuíram com o Vasco da Gama e foram reconhecidas legitimamente pelos presidentes da instituição. Não sei qual é a motivação desse movimento, mas espero que não seja um ato político e persecutório e que prevaleça o respeito às decisões institucionais autênticas.

Sonia Andrade, vice de Campello, também recebeu o título de Benfeitor Remido e o mesmo comunicado do Vasco. Ela, porém, teve outro comportamento: solicitou o cancelamento do título.

- Protocolei no clube um pedido para excluir meu nome dessa categoria de sócio. Direito é direito, dever é dever. Tudo certo. Agora, há de se ressaltar que jamais deixei de pagar o clube, mesmo na categoria de Benfeitor.

Claudio Fernandez, vice de comunicação de Campello, também recebeu o título do ex-presidente ao final da gestão. Ele, porém, não recebeu o comunicado. Entende que pode ter havido algum problema com o e-mail.

- Muito me honra ter recebido o título como um sinal de gratidão pelo tempo dedicado a um cargo não remunerado. Se a nova diretoria entende que não deveria ser assim o procedimento, paciência. Cabe a eles avaliar e tomar a decisão que entendem que devam tomar. Se eu for comunicado, direi que não comprei e que recebi uma honraria.

Fonte: Globo Esporte
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