O acordo entre Vasco e 777 Partners foi assinado, mas o clube ainda tem um processo interno a percorrer. A SAF precisa ser aprovada por conselheiros e beneméritos e depois levada para votação dos sócios em uma Assembleia Geral. Um caminho que promete ser turbulento, uma vez que a questão divide opiniões entre as lideranças políticas.
O ge ouviu os candidatos que participaram da eleição e concorreram com Jorge Salgado à presidência do Vasco, no final de 2020. Figuras influentes no cenário político do clube, que divergem sobre a venda do futebol.
Conversamos com Júlio Brant, Leven Siano, Sérgio Frias e o ex-presidente Alexandre Campello. Perguntamos aos ex-candidatos o que eles acham da constituição da SAF no Vasco, dos moldes do acordo com a 777 Partners e como eles vão se posicionar politicamente.
Entre eles, o candidato da Sempre Vasco nas últimas eleições foi quem se mostrou mais receptivo à ideia da SAF, apesar de ressalvas. É um indicativo de que o caminho tende a ser menos árduo no Conselho Deliberativo, uma vez que o grupo político de Júlio ocupa 30 cadeiras. Outras 120 são da Mais Vasco, grupo do presidente Jorge Salgado. Campello segue a linha de Brant. É favorável, mas cobra mais transparência sobre os termos da negociação para definir pelo voto favorável ou não.
Leven Siano e Sérgio Frias, por sua vez, se mostraram radicalmente contra à venda do futebol do Vasco neste momento. Leven, inclusive, é um dos apoiadores do protesto contra a SAF que acontecerá em 5 de março, em frente a São Januário, com a presença de grupos políticos e torcedores que não apoiam o processo. Veja abaixo as opiniões:
Alexandre Campello
"Não sou contra a SAF, embora eu entenda que esta não é a única solução, talvez seja a solução mais rápida para o endividamento, mas não necessariamente a melhor. Outros clubes no Brasil, que estiveram tão endividados quanto o Vasco conseguiram sair dessa situação, casos de Flamengo, Palmeiras, Grêmio... Acho que as bases têm que estar mais claras, algumas coisas têm que estar mais transparentes, o sócio presida ter conhecimento de tudo para poder opinar.
No primeiro momento, o que eu vejo é um certo ilusionismo com os números. Fala-se em R$ 1,7 bilhão, para justificar isso coloca-se que a 777 entraria com R$ 700 milhões por 70%, portanto os outros 30% que ficam para o Vasco valeriam R$ 300 milhões, mas no entanto o pagamento da dívida fica para o próprio Vasco. A gente não sabe ao certo se nessa compra da SAF eles estariam obrigados a quitar a dívida ou se manteriam parcelado, e aí quem faria o pagamento seria o próprio Vasco. Sem contar questões como o estádio e outros investimentos, que não ficaram claras. Acho que isso precisa ser muito transparente para que o sócio possa decidir".
Júlio Brant
"Sempre estivemos dispostos a conversar sobre a SAF, inclusive aceitamos o convite da diretoria administrativa para fazer parte do comitê que debate os conceitos da SAF. O que nós queremos é que o Vasco tenha a melhor SAF do futebol brasileiro, que represente o tamanho do clube e que faça dessa negociação uma negociação que permita que o clube seja campeão, que preserve os resultados esportivos. Há poucos meses nós fizemos a proposta da pré-SAF, que é exatamente o que eles estão propondo.
Claro que somos favoráveis. Não conhecemos os termos ainda, que é o que nos deixa preocupados, o que está na mesa, quais são as obrigações do clube, quais as condições desse empréstimo que o Vasco está pedindo. Mas isso que está sendo colocado pela diretoria administrativa é exatamente a pré-SAF. A nossa visão é que a SAF pode ser uma bola solução e deve ser colocada em discussão, desde que garanta o melhor resultado esportivo do clube. O que a gente quer é que o Vasco seja campeão de novo. Não só somos a favor, como colocamos na mesa uma proposta há pouco tempo.
Não acho a proposta ideal, mas que deve ser considerada. Acho que o Vasco pode conseguir propostas melhores no mercado pelo tamanho que o Vasco tem. Não é uma proposta ruim, mas o Vasco é a maior negociação em curso no futebol mundial atualmente. Não tem nada disponível no futebol hoje como o Vasco, então precisamos fazer valer esse gigantismo. Podem aparecer outras propostas. Não é excluir, mas é somar.
Não podemos dizer que vamos votar a favor agora, mas termos que analisar os termos. A diretoria administrativa tem que apresentar para o Conselho Deliberativo os termos do acordo, como sempre foi feito, e nessa reunião vamos decidir qual decisão tomar. A gente queria aprovar a previsão do Vasco ter uma SAF no estatuto, isso seria pacífico, o passo 2 é a aprovação dessa SAF. São dois caminhos diferentes, um é ter no estatuto a previsão do clube ter uma SAF, a segunda esta SAF da 777, por exemplo, são dois momentos diferentes. Eu acho que se vier uma boa proposta a Assembleia Geral aprova".
Leven Siano
"Sou contrário à SAF nesses moldes, nesse preço e nas circunstâncias em que o Vasco está. Não sou contrário à SAF. Acho que pode ser uma alternativa inteligente em algum contexto. Não na situação atual do Vasco. A Valuation depende muito do faturamento. E o faturamento na Série B por si só já é prejudicado. Não é o momento. O Vasco não precisa virar SAF para subir. Esse modelo apresentado e que vem sendo praticado no futebol brasileiro, a maior parte dos recursos é financiada pelo próprio clube e pela própria torcida.
Esse aporte de R$ 700 milhões é meia verdade. O que entra são R$ 70 milhões, R$ 50 milhões, geralmente 10% do valor anunciado. O restante é extraído da própria operação do clube. O que gera é uma expectativa de que o futebol terá um desempenho melhor por ser gerido como empresa, mas não é uma garantia. Existem empresas boas e ruins.
Tudo indica que, nesse modelo da 777 Partners, boa parte das receitas virá de arrecadação do próprio clube. O Ronaldo recentemente falou em boas contratações se a torcida chegar junto e igualar o número de sócios-torcedores do Atlético-MG. Ou seja, a própria torcida vai financiar. O americano vai levar, mas quem vai financiar a compra do americano é a torcida do Vasco. Não me parece um modelo atrativo do ponto de vista econômico. O Vasco não pode ser tratado como clube mediano, embora esteja esportivamente em um momento muito ruim.
Na prática, é uma compra de 70% do nosso futebol por R$ 70 milhões. O nosso rival fatura isso em 20 dias. Não tem cabimento. Um clube de massa como o Vasco tem condições de arrecadar R$ 160 milhões por ano com sócio-torcedor. Por que entregar isso para alguém com um valor tão baixo?
Quando o Vasco conseguir se organizar de uma maneira melhor, o Vasco vai conseguir resultados muito melhores. O Vasco é perfeitamente operável. É o contexto menos recomendável para ele virar empresa. Mal esportivamente, administrativamente e financeiramente. Além disso, em um futuro breve, deveremos ter uma negociação por direito de TV de uma liga que está sendo formada. Estamos vivendo tempos de transmissões diferentes, muitas oportunidades. A liga vai melhorar a vida financeira de todos os clubes que participarem. Fico muito desconfiado com uma venda nesse momento em que estamos muito perto desse aumento de receitas".
Sérgio Frias
"Não (sou a favor da SAF no Vasco), mas sou a favor da constituição da SAF no Flamengo. O acordo é ótimo para quem compra e péssimo para quem quer vender sem autorização e na xepa por ter se mostrado incompetente para solucionar os problemas do clube, diferentemente do dito diversas vezes em campanha.
Ninguém pode se posicionar sobre a venda do Vasco, politicamente. Seria uma infantilidade alguém se posicionar num assunto desses por questões políticas e se isso faz parte da pergunta só vem a demonstrar como esse processo está viciado ideologicamente.
O associado do Vasco votará de acordo com o tamanho e grandeza do Vasco, baseado naquilo que, por exemplo, foi dito em campanha pelo hoje presidente do Vasco. "Quando você é um clube associativo sem nenhuma perspectiva de melhora. Finanças completamente deterioradas, sem torcida, uma torcida relativamente pequena", defendendo o próprio Jorge Salgado o clube empresa apenas nesses casos, o que obviamente não se aproxima nem de longe do potencial e tamanho do Vasco".